quarta-feira, 9 de julho de 2008

Hoje tem Augusto dos Anjos





Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos
(Cruz do Espírito Santo, Paraíba, 20 de abril de 1884 - Leopoldina, Minas Gerais, 12 de novembro de 1914) foi um poeta paraibano, identificado muitas vezes como simbolista ou parnasiano, mas muitos críticos, como o poeta Ferreira Gullar, concordam em situá-lo como pré-moderno. É conhecido como um dos poetas mais estranhamente críticos do seu tempo, e até hoje sua obra é admirada (ou detestada) tanto por leigos como por críticos literários.



O Condenado

Alma feita somente de granito,
Condenada a sofrer cruel tortura
Pela rua sombria d'amargura
- Ei-lo que passa - réprobo maldito.

Olhar ao chão cravado e sempre fito,
Parece contemplar a sepultura
Das suas ilusões que a desventura
Desfez em pó no hórrido delito.

E, à cruz da expiação subindo mudo,
A vida a lhe fugir já sente prestes
Quando ao golpe do algoz, calou-se tudo.

O mundo é um sepulcro de tristeza.
Ali, por entre matas de ciprestes,
Folga a justiça e geme a natureza.

Noturno

Chove.
Lá fora os lampiões escuros

Semelham monjas a morrer...
Os ventos,

Desencadeados, vão bater, violentos,

De encontro ás torres e de encontro aos muros.
Saio de casa.
Os passos mal seguros

Trêmulo movo, mas meus movimentos

Susto, diante do vulto dos conventos,

Negro, ameaçando os séculos futuros!
De São Francisco no plangente bronze
Em badaladas compassadas onze
Horas soaram...
Surge agora a Lua.

E eu sonho erguer-me aos páramos etéreos

Enquanto a chuva cai nos cemitérios
E o vento apaga os lampiões da rua!

Canto Íntimo

Meu amor, em sonhos erra,
Muito longe, altivo e ufano
Do barulho do oceano
E do gemido da terra!


O Sol está moribundo.
Um grande recolhimento
Preside neste momento
Todas as forças do Mundo.

De lá, dos grandes espaços,
Onde há sonhos inefáveis

Vejo os vermes miseráveis

Que hão de comer os meus braços.

Ah! Se me ouvisses falando!

(E eu sei que ás dores resistes)
Dir-te-ia coisas tão tristes

Que acabarias chorando.

Que mal o amor me tem feito!
Duvidas?! Pois, se duvidas,
Vem cá, olha estas feridas,
Que o amor abriu no meu peito.


Passo longos dias, a esmo.
Não me queixo mais da sorte

Nem tenho medo da Morte
Que eu tenho a Morte em mim mesmo!

"Meu amor, em sonhos, erra,
Muito longe, altivo e ufano
Do barulho do oceano

E do gemido da terra!"


Gozo Insatisfeito

Entre o gozo que aspiro, e o sofrimento
De minha mocidade, experimento
O mais profundo e abalador atrito...
Queimam-me o peito cáusticos de fogo
Esta ânsia de absoluto desafogo
Abrange todo o circulo infinito.

Na insaciedade desse gozo falho
Busco no desespero do trabalho,
Sem um domingo ao menos de repouso,
Fazer parar a máquina do instinto,
Mas, quanto mais me desespero, sinto
A insaciabilidade desse gozo!


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